RESUMO
O
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objetivo deste artigo
é analisar o conjunto das imagens pedagógicas descritas pelos historiadores do
Padre Inácio de Sousa Rolim. Trata-se de uma pesquisa exploratória com
abordagem qualitativa e como método de análise a hermenêutica simbólica.
Apresentamos como resultado parcial, uma análise sobre o conjunto das imagens
referente à convocação dos alunos para estudarem e em seguida sobre as imagens
da escola/fazenda que teve inicio em 1829. As primeiras considerações
identifica que estas imagens remetem aos símbolos ascensionais, a
escola/fazenda transformada em um colégio de instrução secundária se constitui
na casa/saber, lugar de iluminação, proporciona a luz do entendimento, da
sabedoria, tanto é que repercutiu nas províncias do Piauí, Ceará, Rio Grande do
Norte e Pernambuco.
Palavras-chave: escola. religião. ensino.
imaginário.
FATHER ROLIM: THE
“ANCHIETA” OF NORTHEAST
ABSTRACT
The objective of this article is to
analyze the cluster of pedagogical images identified by historians studying
Father Inácio de Sousa Rolim. This, then, is a piece of exploratory research
with a qualitative approach, which utilizes hermeneutic symbolism. As a sample
of our findings, we present an analysis of images linked with the school/farm
which began in 1829. Our initial considerations are that these images have
recourse to the ascensional symbols, the school became a college of secondary
education, constituting a house of learning, a place of illumination which
brings the light of understanding and wisdom, so much so that the influence
extended to Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte and Pernambuco.
Key Words: school. education.religion.Imaginary.
[1]ProfªDrª do
departamento e no programa de Pós Graduação em Ciências das Religiões da UFPB,
emaileuniceslgomes@gmail.com grupo de estudo e
pesquisa em Antropologia do Imaginário - gepaihttp://gepai.yolasite.com/ - Pesquisa de Pós Doutorado em Ciências da Religião.
[2] Bolsista do PIBIC, pesquisadora do
grupo gepai e aluna da graduação em Ciências das Religiões-UFPB.
[3]Prof.Dr.orientador do Pós Doutorado na
UMESP.
PADRE ROLIM: O “ANCHIETA” DO
NORDESTE
1
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Iniciamos este artigo, justificando a
escolha da temática, por reconhecermos a grande influência que padre Inácio de
Sousa Rolim, civilizador sertanejo e educador, proporcionou no âmbito
educacional, no estado da Paraíba e no Nordeste brasileiro,que foi desconhecido
de nossos cursos e manuais pedagógicos.
O objetivo de nosso estudo consiste emanalisar
o conjunto das imagens pedagógicas descritas pelos historiadores do Padre
Inácio de Sousa Rolim. Esclarecemos que não ficaremos apenas descrevendo as
imagens, mas também sobre o devaneio que estas imagens acendem.
Nessa compreensão, construímos nossa
questão problema: qual será a imagem despertada por ocasião da convocação dos
alunos para estudarem na escola e qual será a imaginação material Bachelard(2002),
das imagens da escola/fazenda que teve início em 1829?
Esclarecemos segundo (GOMES, 2010) que
a imaginação material não é evocativa, passiva diante do mundo, ao contrário
ela é essencialmente criadora, poetificante, inventora de novas imagens. Até
porque resulta do embate entre o homem e o mundo na direção de sentir as
resistências da matéria e operar criando outro mundo.
Nesse sentido estaremos na busca da
força imaginante que estas imagens evocam a partir da teoria do imaginário,
proposta por Durand, porque entendemos que o imaginário é capaz de penetrar e
integrar a diversidade do humano.
Gilbert Durand (2001) elabora a Teoria
Geral do Imaginário a partir da crítica que faz à desvalorização da imagem e do
imaginário no pensamento ocidental, que considera a imaginação como “mestra do
erro e da falsidade”. Esta desvalorização é fruto da ciência moderna, cujo
modelo, global e totalitário, nega o caráter racional, portanto científico, a
todas as formas de conhecimento que não se pautem pelos seus princípios
epistemológicos e por suas regras metodológicas.
No entanto, ao valorizar a razão, em
detrimento do imaginário, a iconoclastia ocidental pretendeu um “pensamento sem
imagem”; mas, por trás da fachada hipócrita do iconoclasmo oficial, o mito
continuou a proliferar de forma clandestina, graças à expansão literalmente
fantástica da mídia que reinstalou a imagem, (SANCHEZ-TEIXEIRA, 2000). Tal fato
evidencia o grande paradoxo da modernidade que, ao mesmo tempo em que recusa a
imagem em proveito da razão, é incessantemente assediada por ela. Segundo
Durand (1994, p. 10),
[...] os
difusores das imagens, a mídia, estão onipresentes em todos os níveis da
representação, da psique do homem ocidental, ou ocidentalizado. Do berço ao
túmulo a imagem está lá, ditando as intenções de produtores anônimos ou
ocultos: no despertar pedagógico da criança, nas escolhas econômicas e
profissionais dos adolescentes, nas escolhas tipológicas de cada um, nos
costumes públicos ou privados a imagem midiática está presente, ora se
pretendendo como “informação”, ora ocultando a ideologia de uma “propaganda”,
ora fazendo a “publicidade” sedutora [...].
Paradoxalmente, a própria razão ao
pretender abarcar tudo, preparou o caminho para o retorno da imagem e da
sensibilidade reprimida. Por não ser sensível à força do seu contrário, o
racionalismo não conseguiu integrá-lo para temperar a sua pulsão hegemônica
(MAFFESOLI, 1998) e, com isso, foi perdendo espaço. Em outros termos, e
lembrando Bachelard (1990), poderíamos dizer que a uma “dialética da razão” se
vem acrescentar uma “dialética da imaginação”, que havia sido rejeitada pela
mentalidade cientificista da modernidade.
Como procedimento metodológico para o
desenvolvimento da análise no primeiro momento realizouo levantamento dos dados
sobre a vida e obra de padre Rolim, contextualizandoa educação brasileira na
épocaa partir das leituras e fichamentosdos historiadores da educação.
No segundo momento, com o propósito de
analisar o conjunto das imagens referente à convocação dos alunos para
estudarem na escola/fazenda e as imagens da escola/fazenda, a partir das
imagens plasmadas no relato dos historiadores que descreveram sobre a vida de
padre Rolim, selecionou como abordagem metodológica a Teoria Geral do
Imaginário de Gilbert Durand, isso por entender que se aproxima mais do nosso
interesse investigativo. Apoiado nessa teoria, consideramos que o imaginário
não é um elemento secundário do pensamento humano, e sim a própria matriz do
pensamento, (GOMES, 2010).
Sendo o imaginário um sistema dinâmico
organizador de imagens, cujo papel fundador é o de mediar à relação do homem
com o mundo, com o outro e consigo mesmo, percebemos que essa função fantástica
do imaginário acompanha os empreendimentos mais concretos da sociedade,
modulando até a ação social e a obra estética. A mitologia é primeira em relação
a qualquer metafísica, mas também ao pensamento objetivo. Os mitos são
manifestos nos atos simbólicos, cuja função é colocar o homem em relação de
significado com o mundo, com o outro e consigo mesmo. (KAST, 1997).
Nessa perspectiva metodológica suspeitamos
estar avançando ao esgotamento da ciência moderna, marcada pelo racionalismo
positivista, que elimina o mito e minimiza o seu papel. Ao contrário, apostamos
no “reencantamento do mundo”, no retorno do homo symbolicus(JUNG, 1982)como
organizador das relações sociais e no equilíbrio entre razão e imaginação,
entre biopsíquico e sociocultural. Essa noção e perspectiva metodológica de
focar o corpus mitológico em relação aos ajuntamentos sociais e desenvolvimento
individual, é extremamente fértil para o estudo do imaginário e da cultura em
seu dinamismo e trajetividade.
Esclarecemos que para efetuar a análiseestaremossituando
no primeiro momentoo contexto histórico da época, bem como alguns dados
biográficos do Padre Rolime em seguida analisaremos as imagensque delimitamos
como recorte.Contudo, temos como firme propósito, expor as próprias imagens
descritas pelos historiadores, para em seguida penetrar no significado interno
de cada uma.
2 O
CONTEXTO HISTÓRICO, EDUCACIONAL E RELIGIOSO
O contexto mundial referente ao século
XIX foi marcado por uma herança iluminista e obteve enormes transformações no
plano político movidas pelas ideias, de autogoverno, de direitos individuais e
da construção de uma sociedade de homens livres. Em seguida, surgiu o
incremento do comércio e da indústria como uma nova realidade, que se sonhava e
se lutava desde o Renascimento, a esperança de que o novo, o moderno, chegasse
ao alcance do homem comum.A necessidade de instruir o homem, de torná-lo
cidadão e de promover a investigação científica como meio de democratizar o
progresso, foi uma das primeiras iniciativas a serem tomadas.
No Brasil, apesar das absorventes
pelejas do seu povo, permaneciauma situação de dependência, ora de Portugal,
ora da Inglaterra, ora dos Estados Unidos.No entanto, é possível perceber comoa
educação foi um dos instrumentos para promover ou conservar essa vinculação,
seja através da supressão, impedindo o acesso de grande parte dos brasileiros à
escola; seja através do ensino desprovido da preocupação crítica. O que
proporcionou o Brasil permanecerpor um bom tempo como um país essencialmente
agrícola, mantendo inalteráveis os latifúndiosbem como as terras devolutas,o
que favorecia o atraso e a inexistência de instituições seja no âmbito científico,
seja no âmbito cultural, (PIRES, 1991).
Ao longo da história, é conhecido como
a igreja católica e protestante elaborou estratégias de ação relacionando
religião e educação. De forma sucinta estaremos prendendo-nos especificamente
na influência da reforma protestante e da contra reforma na educação brasileira.
Quanto à reforma protestante, segundo
(GOMES-DA-SILVA, 2003, p.57), “a educação era alvo das elaborações dos
reformadores protestantes, foi com a reforma que os empobrecidos tiveram direito
à educação e, portanto, acesso às informações necessárias para se posicionarem
politicamente”.
No período da reforma protestante, já estava
presente a relação da paróquia/escola, o que formava um complexo integrado e
obrigatório. Onde se tinha uma paroquia se tinha um prédio de educação
religiosa, predominava o interesse pela educação e pela transformação social. No
Brasil várias igrejas foram construídas com esta estrutura, oferecendo aos seus
fieis o ensino e formação cristã. Interessante que identificamos esta relação
paróquia/escola, também com padre Rolim, quando construiu a escola e paróquia
na fazenda Cajazeiras onde morava, embora que tenha se dedicado muito mais na
educação.
O projeto educacional dos reformadores,
portanto consistia em assumir a integralidade do homem (corpo-alma), pensava-se
em uma escola para todos.Uma escola laica capaz de formar uma consciência crítica.
Esta proposta se materializou com Lutero que favoreceu as implicações
pedagógicas na política educacional quinhentista, vejamos:
Uma proposta que rompeu com a mentalidade
católica, medieval, aristocrática e feudal, através de dois processos:
primeiro, valorizando a língua nacional, a partir das traduções, publicações e
criação de escolas; segundo, propondo um modelo educacional fora dos parâmetros
escolásticos (Artes Liberais), utilizados para preparar os jovens candidatos à
vida monástica.(GOMES-DA-SILVA, 2003, p.61)
Quanto aos Jesuítas no Brasil, encontramos
nos registros históricos da educação brasileira, que durante um período de
duzentos e dez anos eles se responsabilizaram pela educação e pela orientação
religiosa a ser seguida, aperfeiçoando a sua prática de acordo com os
interesses propostos.
Aos poucos os jesuítas foram penetrando
nas aldeias indígenas, na senzala dos escravos, na casa-grande dos senhores de
engenho, e procuravam orientar na fé e ensinar as primeiras letras adaptando as
necessidades específicas de cada grupo que por ele passava. A perfeita
organização, o cuidado na preparação de professores, os métodos de ensino aprender
pouco mais bem aprendido, foram pilares fundamentais para o sucesso de sua
atuação.
Porém, foi com a chegada da Família
Real portuguesa, que veio alterar o quadro da educação em que o Brasil vivia. Com
D. João VI a educação superior passou a ser preocupação do Estado. O conflito entre
o Marquês de Pombal e os Jesuítas, atribuindo-lhes intenções de opor-se ao
controle do governo português, favoreceu a expulsão dos Jesuítas em 1759, surgindo
às reformas do Marquês de Pombal e sendo criadas as aulas régias de latim, grego e retórica.
O encargo da instrução passou a
responsabilidade de capelães nomeados pelos bispos, porém, o imposto criado
para ser aplicado na educação, já se mostrava insuficiente. No entanto, todas
essas iniciativas educacionais visavam atender as necessidades da Corte. Vale
salientar que a sociedade da corte estabelecida no Brasil possuía os mesmos
requintes da Corte europeia, principalmente a francesa.
Entretanto, quando o Brasil ganha a sua
independência de Portugal, momento de grande influência do Ideário da Revolução
Francesa, mantiveram acesos os debates quanto à implantação de um programa de
instrução popular para o Império recém-nascido, e em quinze de outubro de 1827,
foi criada a lei que determinava a criação de escolas de primeiras letras em
todas as cidades, vilas e lugarejos e de escolas de meninas nas cidades e vilas
mais populosas, sendo implantado o método lancasteriano.
Esta lei favoreceu o processo de educação
na fazenda Cajazeiras, em período que padre Rolim, ao retornar do seminário, já
como sacerdote, assume a paróquia construída por sua mãe na fazenda e vai dar
inicio a sua escola, a casa/fazenda, apenas com seis alunos, que estaremos
descrevendo com maiores detalhes no momento da análise.
É necessário registrar que, em 1867, “a
população brasileira andava perto de nove milhões. E com esse contingente havia
um milhão e duzentos mil indivíduos em idade escolar, dos quais apenas, 10°/°
encontrava escola para instruir” (PIRES, 1991).
Nesse contextohistórico/educacional
brasileiro, que descrevemos de forma sucinta, nasceu Padre Rolim,aos vinte e
dois dias do mês de agosto do ano de 1800 no sítio serrote, hoje município de
Cajazeiras-PB. Ele passou sua infância na primitiva Fazenda das Cajazeiras, ao
lado dos irmãos mais velhos e os que vieram após ele. Desde muito cedo,
demonstrava grande interesse pelas Letras. Aos dezesseis anos, já falava
fluentemente o Francês e dedicava-se ao estudo do Grego e do Latim, o que levou
Ana e Vital seus pais, a encaminharem a convite de Dona Bárbara de Alencar, o
filho à cidade do Crato,
no Ceará, onde permaneceu, por quatro ou cinco anos, fazendo os estudos preparatórios
para o ingresso no Seminário.
Padre Inácio de Sousa Rolim ingressou no
Seminário de Olinda em três de setembro de 1822.
O exercício do magistério, no seminário de Olinda, rendeu-lhe, alguns anos
depois, o convite do Governador de Pernambuco para instalar a cadeira de Grego
no Ginásio Pernambucano, quando teve oportunidade de realizar a edição da sua
Gramática Grega, obra impressa no ano de 1856, em Paris. Padre Rolim veio a
falecer no dia dezesseis de setembro de 1899, vitimado por uma
astenia cardíaca senil.
3 O
CONJUNTO DAS IMAGENS
Estaremos respondendo nossa questão
problema: qual será a imagem despertada por ocasião da convocação dos alunos
para estudarem na escola e qual será a imaginação material Bachelard(2002), das
imagens da escola/fazenda que teve início em 1829?
A imagem despertada por ocasião da
convocação dos alunos para estudarem na escola remete ao herói. Padre Rolimde
forma destemida enfrenta vários obstáculos, um deles é o sol ardente,
símboloespetacular do regime diurno, segundo (DURAND, 2001);o sol e seu
isomorfismo entre céu e luminoso, entre a pureza celeste e brancura, prefigura
fortemente o dourado com toda luminosidade e ardor.O calor não impede Padre
Rolim de cavalgar sertão adentro em busca dos filhos dos fazendeiros
circunvizinhos.
A distância do caminho a ser percorrido
era outro obstáculo, o percurso era imenso, cavalgava quilômetros na estrada de
forma solitária, até encontrar um povoado distante e lá fazer o seu chamado
para a escola, com a intenção de conseguir um aluno. Um caminho que muitas
vezes trazia empecilhos, perigos, e que não se sabia ao certo onde iria chegar,
apenas que deveria seguir.
Outro obstáculo era o enfrentamento com
a família dos fazendeiros, a resistência dos pais para liberar o filho era
muito grande, o filho estava trabalhando no roçado, e para conseguir que o pai
liberasse o seu filho, Padre Rolim usava de vários argumentos, vejamos o seu
argumento com um dos fazendeiros: “Sr. Joaquim Arco Verde, se o homem não sabe
ler, ele não existe”, (PIRES, 1991).Padre Rolim acreditava que a educação é o
que salva o homem e que pelo conhecimento o homem existe plenamente, por isso
buscava os filhos dos fazendeiros para educar, para instruir e esperava que o
progresso, o desenvolvimento chegasse para Cajazeiras. Interessante que não
encontramos registros de que ele relacionasse a educação à formação de sacerdote,
embora dentre seus alunos, tenha saído como sacerdote, como é o caso de Padre
Cícero de Juazeiro-CE.
Encontramos registro de que padre Rolim
em sua jornada ao encontrar os lugarejos, batia de casa em casa buscando seus
alunos, fazendo apossível saudação devida, como relata o historiador Celso
Mariz, (PIRES, 1991). É comum na cultura sertaneja, como forma de saudação
pronunciar: “louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo”, saudação típica do
nordestino, aguardando a resposta: “para sempre seja louvado”. O silencio
permeava, emseguida descia do cavalo e sentava para conversar.
Padre Rolim, vestido com sua
indumentária sacerdotal, de cor preta, montado em cima do cavalo com sua capa
em forma de mantoo que remete a um atributo real,manto de majestade cobrindo e
protegendo o seu corpo, aparecia. Entregar seu manto é dar-se a si mesmo, Elias
fez isso com Eliseu conforme registro bíblico no antigo testamento da Bíblia
Sagrada, e padre Rolim procurava os alunos, para dar em troca o mantodo
conhecimento que recebera, pois era douto no saber, um poliglota como registra
os historiadores, assim, procurava passar o manto do conhecimento para estes
filhos dos fazendeiros, preparando-os.
O chapéu preto típico para a época e
local,protegendo a cabeça do sol que ardia com o calor do dia e pela longa
estrada pecorrida, parecia corresponder a uma coroa,ao signo do poder, da
soberania. “Em sua qualidade de peça que
cobre a cabeça do chefe,simboliza também a cabeça e o pensamento” nos afirma.
(CHEVALIER,GHEERBRANT,2002, p.232).
Assim, em meio à poeira cinzenta da
estrada, sendo conduzido pelo ímpeto da corrida, galopada às cegas,aparecia
montado em cima de um cavalo, prefigurando um simbolismo de poder e pureza, autoridade
e temor. Era o próprio cavaleiro, o soberano, defensor do seu território, do
seu tesouro intelectual, de suas próprias visões de mundo, que traçava um
verdadeiro combate com a família dos fazendeiros para que liberassem um filho
apenas para estudar, assimproferia a segunda pergunta: “sei que o senhor tem
filho em tempo de escola”,como relata o historiador Celso Mariz, (PIRES, 1991)
interessante é que ele afirmava, sei que tem, a sua determinação em educar era
o que fazia enfrentar os obstáculos na caminhada. E assim fez, dando início à
escola apenas com apenas seis alunos.
O alistamento feito por padre Rolim,
buscando seus primeiros alunos, permitiu que o prédio fosse aumentando com a matrícula
de novos alunos, (PIRES, 1991): “A sua casa de ensino se fazia à proporção que
chegavam os novos discípulos. Cada aluno esperava por seu teto, embora já
encontrasse o seu livro”.
Foram inúmeros os alunos que passaram
pela escola do Padre Rolim, dentre eles, figuras ilustres como: Padre Cícero
Romão Batista; Joaquim Arcoverde de Albuquerque
Cavalcanti, o Cardeal Arcoverde; José Peregrino de Araújo , Governador da
Paraíba, Deputado Estadual/RN e Deputado Federal/PB; João Gualberto Gomes de Sá
, Deputado Provincial e Juiz de Direito; Leonardo Salgado Guarita , advogado,
promotor e Desembargador do Tribunal de Apelações do Rio Grande do Sul; Padre
Manoel Mariano de Albuquerque, entre dezenas de outros alunos que se projetaram
nos cenários políticos, cultural e social do país.
Percebemos que todo ato guerreiro de
Padre Rolim ao enfrentar a aridez do sertão nordestino, os fazendeiros, os alunos
para sua escola, o desafio de assumir todo o processo educativo em forma de
internato, iniciando apenas com seis alunos, na serraria da fazenda em que
habitava, garantindo a comida, a dormida e o estudo, por um lado remete ao
herói, ao enfrentar as adversidades, aopreparar o sertanejo para desenvolver a
fazenda de cajás que aos poucos vai criando sua autonomia e espaço se
emancipando e tornando-se a cidade de Cajazeiras no sertão nordestino, local de
referência, de busca pelo saber, “a escola de padre Rolim”.
Assim o simbolismo ascensional, em
marcha, montado em cima do cavalo, em pé ensinando aos seus alunos, se coloca
como a reconquista de uma potência perdida. Reconquista pela ascensão do mestre
que se coloca para ensinar, preparar homens. A jornada exige o herói, o
guerreiro que tem armas, no entanto, estas armas do herói são os símbolos do
conhecimento, do saber.
Às margens do rio de água cristalina, que
escorria para frente seus filetes atravessando a fazenda, abrindo um caminho
refrescante, foi construída, no ano de 1804, uma casa conhecida como “A Casa
Grande da Fazenda”. Este espaço aconchegante, cheio do frescor da brisa que
permeava, era convidativo para nele se alojar e desfrutar com seus deleites que
a terra produzia, tanto é quefoi habitada pelos pais de Padre Rolim quando
vieram se estabelecer nesta região oferecendo a princípio o trabalho da atividade
agropastoril, local que o padre viveu a sua infância e sua mãe construiu uma
pequena paróquia, no período em que ele se encontrava no seminário.
Ao retornar do seminário, Padre Rolim, embora
tenha assumido a paróquia na fazenda ele avança e toma a iniciativa pioneira na
cronologia dos estabelecimentos de ensino no sertão nordestino, proporcionando
a abertura de uma escola, nesse espaço mágico por natureza, a fazenda dos seus
pais em 1829. Assim, dava início às atividades da escolinha da Serraria (local
onde se serrava a madeira usada nas construções das casas), uma casa pequena
que abrigava meia dúzia de estudantes - embrião do colégio - que, mal grado a
modéstia de suas instalações, ia crescendo em número de alunos dado o alto
nível do ensino que habitava seus discípulos a ingressarem no curso superior.
A casa/ fazenda, remete aos símbolos da
intimidade do regime noturno como nos afirma Durand (2001),ao útero, lugar de
aconchego, de acolhimento, local de refugio, pois os filhos dos fazendeiros
haviam se retirado da sua casa de origem para irem passar boa parte do seu
tempo em forma de internato, exclusivamente nesta casa/fazenda, onde recebia o alimento,
a dormida, o saber. Esta escola, que
começou com seis alunos possuía uma programação rigorosa a ser cumprida
iniciando com o despertar às cinco da manhã.
Durante todo o dia existia atividades
para seremrealizadas devidamente para cada horário estabelecido (PIRES, 1991),
os alunos amanheciam tendo como primeira missão após a higiene pessoal e o café
da manha, preparar a missa, em seguida, uma série de metas deveriam ser
cumpridas terminando por volta das vinte horas da noite.
Na programação da escola, havia uma
conferência semanal, todas as sextas-feiras que denominava de “quilo”.
Consistia em uma palestra entre o padre/educador e os alunos. Padre Rolim
sentava-se na tribuna, no centro, local do chefe, o que remete ao símbolo
ascensional, e os alunos silenciosos e atentos tomavam os seus lugares nos
banquinhos feitos de tijolos o redor.
O padre/educador procedia à leitura de
trechos escolhidos e fazia as admoestações necessárias à vida colegial. O quilo
durava uma hora e meia.Nesta casa/saber prefiguravao candeeiro do conhecimento
que deveria permanecer aceso com esta luz do saber que se desvelava a cada
conhecimento adquirido, formando discípulos e homens doutos no conhecimento.
A precariedade das instalações da escola
não era a principio uma preocupação para o Padre Rolim, a casa/saber era que
importava, cada aluno tinha o seu livro, o seu material de estudo e recebia o
necessário para sua sobrevivência, o seu único desejo era transmitir o
conhecimento a seus parentes e a outros jovens filhos dos fazendeiros.
Só em 1836, quando se apercebeu da
repercussão que sua obra ia alcançando em todo sertão e nordeste brasileiro, é
que se dispôs a transferi-la, para um prédio de alvenaria que, embora de
pequenas proporções, melhor se adaptava às atividades a que se destinava.
Depois transforma em um colégio, era o primeiro colégio da Paraíba no ano de
1843, o colégio Salesiano.
Em torno do colégio, foi crescendo o
povoado, com grande crescimento. A Fazenda das Cajazeiras passou de simples
povoado à condição de Vila, sede de comarca e depois cidade. Por isso Padre
Rolim é considerado o fundador de Cajazeiras, pois foi a sua obra que alavancou
o surgimento da cidade. Tal fato levou a criação da frase: “Cajazeiras, a cidade
que ensinou a Paraíba a ler" (PIRES, 1991).
Em 1843, a atividade do Padre Rolim já
repercutia em quase toda região sertaneja e municípios circunvizinhos, nas
províncias de Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte e Pernambuco,
expandindo-se por todo o nordeste brasileiro levando-o a transformar seu
estabelecimento de ensino em colégio de instrução secundária de forma que
começou a atrair vários estudantes, como exemplo o Padre Cícero, do Juazeiro do
Norte.
Na década de sessenta, o colégio
atingiu a sua fase culminante. Em 1862, o colégio funcionava com três aulas
(latim, francês e geografia), frequentando oitenta e cinco alunos. No entanto,
depois de quarenta e oito anos de funcionamento aconteceu o fechamento do
colégio em 1877, devido a forte seca que atingia toda região, como também a
epidemia da cóleraque vitimou grande parte da população como registra os
historiadores, o Mestre Rolim, o destemido, o padre/educador iniciou uma fase
de decadência, vitimado pela tristeza de não mais poder manter seu colégio como
antes, mas permaneceu na cidade até a sua morte.
CONSIDERAÇÕES
Respondendo nossa questão problema,
consideramos que a imaginação material despertada sobre o conjunto das imagens
referente à convocação dos alunos para estudarem na escola e sobre as imagens
da escola/fazenda que teve início em 1829 remete a estrutura mística, até
porque entendemos que a palavra mística não se trata do sentido religioso, e
sim, é tomada no seu significado mais comum de vontade, de união, do gosto pela
secreta intimidade da qual Padre Rolim desenvolve em seu percurso histórico e
atividade exercida tanto na educação, no sacerdócio quanto no papel de
pesquisador, estudioso da história natural e das diversas letras das quais
estudou tornando-se poliglota.
A estrutura mística do imaginário,
diante da angústia existencial e da morte, do caos, de perceber uma grande
fazenda, precisando ser povoada, explorada, faz com que padre Rolim, negue as
dificuldades e busque um mundo em harmonia preparando alunos para se tornarem
homens doutos no saber de forma que desenvolvam o vilarejo e o torne em cidade,
assim acontece aos poucos o vilarejo tornou-se a Cidade de Cajazeiras-PB, ou
seja, um mundo em harmonia baseado no aconchego e na intimidade (de si, e das
coisas), no aconchego religioso e intelectual, no aconchego da casa/saber.
A imaginação material de Padre Rolim
remete ao ideário do homo faber, da
casa oficina, da casa escola como lugar do construtor, da escola como o sonho
do projetista, do arquiteto, a escola das mãos. Remete a uma ideia de educação
que está surgindo na modernidade com grande vitalidade. Não a escola do acúmulo
e esquecimento de conteúdos, mas a escola da visão ampliada, dos projetos, do
fazer, do construir. Muito nitidamente seus alunos mais ilustres foram
importantes projetistas sociais, articuladores comunitários, artesãos,
artífices do ajuntamento político, religioso, da regulação social na
jurisprudência.
A velha oficina remete à marca
inspiradora da educação do fazer, da educação da mão na massa, no lápis da
história, no martelo. A escola forja, da bigorna e do malho. Uma pedagogia de
Efestus? Padre Rolim um herói dos trânsitos de informação prática, dos negócios
de vidas (levar as crianças, convencer os pais para educá-las, tirar de suas
casas para a casa oficina, a escola rodeada de ferramentas, de lembranças do
suor do artesão, do labor das mãos.). Rolim um Hermes? Talvez Hermes seja o
deus que agregue a ideia do herói com a mística do informar, conduzir diálogos,
confiar conhecimento, agregar sonhos, permitir a procriação de novos conteúdos
e sonhos.
A Fazenda dos pais é o cosmos de Rolim?
Seu sonho cosmogônico de fundar vida nova, de arquitetar uma cidade de
conhecimento? Rolim e sua cosmogonia educacional? A Fazenda agrega toda a vida,
é o centro do mundo do sertanejo. Desde as fontes e poços, os animais, as
plantas, até a casa, o Pai, a Mãe. O cosmos é o sonho educacional de Rolim. A
fazenda, a escola oficina velha. Um artífice de almas.
Acreditamos que esta inspiração da
velha oficina que ficou escola é núcleo, cerne imaginal que percorreu e afundou
o sonho de Rolim no tráfego da imaginação material aos símbolos mais antigos do
homem construtor, do trabalhador que cria o mundo, do demiurgo das obras do
mundo.
Enfim, imaginar é criar o mundo, é
criar o universo, seja através das artes, através das ciências, ou através dos
pequenos atos, profundamente significativos, ele imaginou e criou uma escola,
uma casa/saber, um candieiro aceso pela luz do conhecimento.
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